A possibilidade dos pets de figurar como autores de ações judiciais

Foto: Andrew S via Unplash

Você já imaginou ser processado pelo seu animal de estimação? Ou um pet acionando o Poder Judiciário para pleitear seus direitos? Saiba que é possível!

Para fins de direito civil os animais são considerados apenas como “coisa”. Entretanto, a proteção legal dada pelo artigo 225, §1º, VII, da Constituição Federal¹ confere a estes o caráter de sujeitos de direito, na medida em que visa proteger a sua dignidade, retirando-os assim da qualificação como objeto.

É a partir do reconhecimento dos animais como sujeitos de direito que surge a possibilidade destes de figurar em juízo requerendo indenizações, aplicação de multas, pensão, dentre outros.

Para isso, os animais precisam estar representados, evidentemente. A representação pode ser pelo Ministério Público, por entidades protetoras ou pelos seus responsáveis legais (tutores).

Chancelando esse entendimento, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, em decisão² inédita acerca do tema, reconheceu a possibilidade de dois cães vítimas de maus-tratos figurar como autores de uma ação na qual pleiteiam o recebimento de indenização por danos morais e pensão mensal.

Neste caso, os animais foram resgatados por uma ONG na cidade de Cascavel após passar 29 dias sozinhos enquanto os seus tutores viajavam, o que configura situação de abandono e maus-tratos – justificativa para o pedido de indenização. Já a pensão mensal tem por finalidade a manutenção de uma vida digna aos cães enquanto estes não encontram uma nova família.

Ainda dentro do direito civil, mais especificamente na esfera do direito das famílias, tem-se a conceituação de “família multiespécie”, na qual os animais são considerados como um membro da entidade familiar, o que pode ensejar a propositura de uma ação para regulamentação de guarda e visitação³ pelos tutores no caso de um divórcio, por exemplo.

Em Jacareí, no interior de São Paulo, o Poder Judiciário concedeu a um casal a guarda compartilhada do cão que criavam juntos. Por se tratar de um ser vivo, a sentença levou em consideração critérios éticos, numa analogia com a guarda de um humano incapaz.

O casal estava em processo de divórcio e, provisoriamente, foi determinada a guarda alternada do cachorro, que deveria permanecer cada semana na casa de um de seus tutores.

Havendo a finalização do divórcio, é possível determinar que o animal tenha a residência fixa na casa de um dos tutores, com direito de visitas ou de passar finais de semana com o outro tutor.

As demandas envolvendo a questão da guarda dos animais já vem aparecendo há algum tempo perante o Poder Judiciário, mas o reconhecimento destes como autores de ações judiciais é entendimento recentíssimo e que certamente abre um importante precedente para a causa animal.

Nas palavras do professor adjunto do Departamento de Direito Civil e Processual Civil e da Pós-Graduação em Direito da UFPR, Vicente de Paula Ataide Junior, “as ações indenizatórias propostas por animais, devidamente assistidos em juízo, bem em breve ocuparão o cenário judiciário brasileiro. Animais não são coisas. São sujeitos de direitos fundamentais, os quais, uma vez violados, devem ser reparados em juízo. Por isso, não se pode negar que animais detêm capacidade de ser parte.

Para além das polêmicas, qualquer animal é dotado de direitos que merecem ser respeitados e nada mais justo do que a infração destes ser devidamente punida, com a reparação dos danos revertida em prol do próprio ser não-humano que foi vítima.

 

¹Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

  • 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (…)

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade. 

² Acórdão proferido no Agravo de Instrumento nº 0059204-56.2020.8.16.0000, 7ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

³ Como ocorre como crianças e adolescentes.

Por Bianca Ungaratti
26/10/2021 19h15

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