“Marighella” marca com alguns percalços a estreia de Wagner Moura como diretor

Foto: O2 Filmes

Trazendo como enfoque um dos personagens mais controversos da história brasileira, “Marighella”, dirigido por Wagner Moura, se mostra atual e intimidador mas peca com roteiro descompassado que atrapalha o envolvimento do público com a trama.

O longa biográfico acompanha o político brasileiro Carlos Marighella, um dos principais organizadores da luta armada no país contra a ditadura militar nos anos 1960. A história começa depois da soltura de Marighella, que passou anos sendo torturado pelas forças armadas. O político é interpretado por Seu Jorge que se deixa envolver nas dores do personagem e entrega uma performance exímia. 

Junto com Seu Jorge, o elenco é o que faz dos 215 minutos de filme suportáveis. As atuações de Humberto Carrão, Adriana Esteves e Luiz Carlos Vasconcellos dão alma ao enredo. Bruno Gagliasso tem um papel especial, não apenas por dar vida ao antagonista Delegado Lúcio, mas também por implicar uma intensidade ao personagem similar a de Marighella e seus seguidores balanceando os núcleos.

Marighella: Wagner Moura

Foto: O2 Filmes

Visualmente o longa é a cara do Brasil, o que é um alívio já que numa produção como essa, centralizada na história do país, a americanização não teria espaço. Desde a diversidade entre os atores às cores usadas para colorir o filme, tudo parece ter sido tirado de uma foto antiga que dá para encontrar no baú dos seus avós.

Já quando o assunto é roteiro a trama falha ao orbitar clichês e têm dificuldade, do início ao fim, de encontrar um ritmo que se encaixe na história. Os planos das personagens parecem simultaneamente estar à beira de um colapso, ter acabado de começar e estar perto do final. A história, apesar de rica em detalhes e aparentemente com começo, meio e fim, dá a impressão de ter sido pensada para outro formato e cada evento distinto parece um episódio isolado de uma série da Netflix. 

Outro detalhe que incomoda são as frases prontas que o filme traz sem nenhuma adição a história, como o monólogo a respeito da etnia de Jesus. Apesar de ser verdade, o trecho parece ter sido colocado no filme apenas como uma provocação, para gerar desconforto em um tipo específico de espectador, como se o resto da história não gerasse o suficiente. 

Marighella

Foto: O2 Filmes

Apesar de seus problemas, “Marighella” se mostra necessário no cenário atual do país, onde ao invés de aprender com os erros do passado, parte da população se vê imersa num desejo tolo de voltar a uma era de terror coagida pela ação do exército brasileiro. Também inspira o desejo de luta pelos direitos individuais, tanto do coletivo quanto de instituições formadoras da sociedade como a imprensa. 

“Marighella” promete dar o tom de como será a carreira de Wagner Moura como diretor, e com um início assim, Moura promete ser um dos grandes nomes do cinema nacional.

Por Deyse Carvalho
04/11/2021 12h09

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