Dilemas de Carnaval (parte II)

Aproxima-se o carnaval. Cura dos desvalidos, desforra dos oprimidos, apoteose da brasilidade.

Etc. Etc. Etc.

Semana passada, exploramos três dos possíveis destinos para a festa do Rei Momo. Se quiser entender as combinações anteriores, sobretudo se for dos que odeia farra, odeia viagem – ou odeia os dois – clique aqui para ler o texto antecedente.

Munidos dessas informações, podemos continuar.

Viajar e Farrear

O carnaval por excelência, a materialização de um ideal, o encontro do mundo das ideias com o mundo sensível. Ruim para o bolso e para o fígado, ótimo para seus netos, que terão muitas histórias para ouvir (a maior parte delas, espera-se, depois da maioridade).

Aqui, abre-se um mundo de possibilidades. No entanto, alguns alertas são da ordem do dia.

Para Bloquinhos de Rua ou Espetáculos Abertos

Coloque o celular por debaixo da roupa, não dentro de pochetes, que são um chamariz para ladrão. Se estiver sem calça, bermuda ou mesmo roupa de baixo, tudo bem, basta prender o aparelho numa corrente ao redor do pescoço (e rezar).

Nunca siga o bloquinho muito próximo do trio elétrico. Existem chances consideráveis de você ser encurralado por uma multidão tão grande, em um espaço tão reduzido, que, mesmo se for alto e forte, terá dificuldades de expandir o diafragma para respirar. Se se encontrar nessa situação, faça coro aos “para de empurrar! Para de empurrar” do mar de pessoas enquanto, claro, continua a empurrá-las para não morrer esmagado.

Se alguém começar a girar os cabelos próximo a você, fuja. Sobretudo se eles estiverem molhados com um líquido de origem duvidosa e aroma acrimonioso. E, se você realmente não souber o que é golden shower, pesquise pelo Google, não pelo Twitter.

Se for gay e estiver com sua melhor amiga, também gay, nunca, em hipótese alguma, se ajoelhem no chão da praça no centro da cidade e, desvairados, como se numa fissura acumulada de meses, comecem a catar os preservativos arremessados pelo cantor à plateia. Vocês poderão ser tomados por maníacos sexuais ou, ainda pior, por um casal hétero.

Se o dilúvio vier, abrigue-se na farmácia mais próxima e se una à força-tarefa de funcionárias que, rodos nas mãos, panos nos pés, lutam para que a água não invada e inunde o estabelecimento. Quando, depois de quarenta minutos, um motorista de aplicativo finalmente aceitar ir em seu resgate, torça para que ele não suba a calçada e fure o pneu ali mesmo, no ato.

Para Festas ou Shows Fechados

Ao utilizar banheiros químicos, deixe a porta aberta. Caso contrário, um segurança à procura de drogas ilícitas poderá sacudir a estrutura de tal forma que você se urine inteiro, enquanto pede misericórdia aos céus por aparentemente estar no epicentro do primeiro grande terremoto em terras brasileiras. Abra a porta com cuidado, sem olhar torto para o segurança, e faça questão de mostrar o que tem na mão, a fim de deixar claro que não era cocaína, era só xixi.

Escolha um lugar estratégico. Assistir ao show é importante, mas conseguir buscar bebidas também é essencial. Se ficar muito longe, será incapaz de testemunhar fenômenos únicos da natureza, como Anitta a cantar, pular e rebolar no palco por três horas ininterruptas, como se estivesse incorporada de todos os deuses do sincretismo nacional. Se ficar muito perto, é bastante provável que, sem acesso ao bar, você se veja completamente sóbrio em questão de minutos, em meio a uma horda de homossexuais suados empurrando você para lá e para cá enquanto gritam segura segura na corda do caranguejo.

Tomadas as devidas precauções, se divirta muito. Abrace os amigos, beije o namorado se for de namorado, passe o rodo – dessa vez, não literalmente – se for de passar o rodo, use – e realize – fantasias, sinta o vento rodopiar e, assanhado, passar a mão por dentro da sua roupa enquanto um fio de cerveja quente desce pelo peito e, sobretudo, mesmo que seja ruim da cabeça e doente do pé, sambe, sambe muito, sambe ainda que, no remelexo, pareça um gringo com urticária.

Independentemente do destino, escolher bem é essencial. Lembre-se: festa igual a essa, só ano que vem.

Por Pedro Jucá
31/01/2023 09h40

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