03 filmes que retratam histórias que Hollywood evita contar

Sabe-se que o patriotismo norte americano é sempre exaltado e explorado em diversas produções hollywoodianas. O American Way of Life, que se firmou após as duas guerras mundiais, pregava um modelo ideal de vida com padrões de comportamento relacionados ao consumo, religião e principalmente nacionalismo. Décadas depois tal estilo de vida continua sendo refletido no cinema, colocando o estadunidense constantemente na pele do herói e sendo exaltado perante outras nacionalidades. Essa fórmula tão repetitiva ao longo de décadas vem sendo abraçada pela The Academy (sim, aquela que seleciona os finalistas e vencedores do Oscar) e não é difícil imaginar o porquê.

O fato é que graças a alguns diretores, que optaram por retratar outras narrativas e ampliar nossas perspectivas, podemos acessar uma realidade norte-americana, que por conveniência é frequentemente esquecida. Conheça a seguir 03 produções que trazem protagonismo para os excluídos da América.

The Florida Project (2017)

Provavelmente o mais popular da lista, seja pela excelente direção e roteiro de Sean Baker, ou pela indicação de William Dafoe ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, o filme traz um retrato cru e muitas vezes incômodo sobre a vida de algumas famílias que vivem em móteis pela estrada que leva até o parque Walt Disney World. São prédios multicoloridos, esteticamente atraentes, batizados com nomes como “Magic Castle”, por exemplo, mas que escondem tanta pobreza e insalubridade que acabam fazendo um contraste curioso com o “lugar mais feliz da Terra”.

As personagens centrais da história são Moonee (Brooklin Prince), uma garotinha de 6 anos e sua mãe Halley (Bria Vinaite), que juntas dispõem de uma química tão verossímil em cena, que às vezes o filme parece ter um caráter documental. O fato é que há um certo encanto na vulgaridade expressa pelos personagens, que nos conquistam simplesmente por serem humanos. Moonee é jovem demais para entender o seu lugar no mundo, mas já parece ter sagacidade o suficiente para saber como encarar sua própria realidade. Por outro lado, Halley exala falta de maturidade, mas talvez seja isso que a aproxima tanto da filha. A narrativa é emocionante e mostra que em meio ao caos e a anarquia, ainda há um pouco de empatia. O destaque para o personagem de Dafoe como síndico, talvez seja por sua presença paterna figurativa para diversas famílias encabeçadas por mães solteiras que vivem ali, sendo uma referência de autoridade, mas também de humanidade.

O filme está disponível no Brasil, através da plataforma Amazon Prime.

Elephant (2003)

Inicialmente parecemos estar diante de mais um filme adolescente, que irá abordar à sua maneira as trivialidades e dificuldades de se atravessar a fase escolar, onde haverá um final celebrando alguma lição de maturidade, mas na verdade é muito mais do que isso, ou nada disso. Sem muito aprofundamento, o filme começa retratando um dia corriqueiro em uma escola pública de Portland, chamando atenção para tópicos como bullying, ansiedade social e bulimia. Uma série de cortes nos faz ir acompanhando, até então sem razão específica, a rotina de alguns alunos através de uma perspectiva subjetiva, é como se estivéssemos seguindo cada um deles de maneira discreta e observando todos os seus passos.

Aos poucos a narrativa se centraliza entre dois personagens centrais, Alex (Alex Frost) e Eric (Eric Deulen), uma dupla de amigos que compartilha da mesma rejeição e dificuldade de se encaixar na escola e provam como o saldo disso pode ser de extrema gravidade. Com uma espantosa praticidade, Alex e Eric decidem comprar armas pela internet e é aí que tudo parece começar a se desenrolar. O diretor Gus Van Sant decide falar sobre o “elefante na sala” e faz referência ao massacre de Columbine, quando dois jovens invadiram a própria escola armados e executaram 13 pessoas antes de tirarem suas próprias vidas. O filme tem um caráter intimista, por isso acaba focando muito mais nas ações e comportamentos do que em diálogos, proporcionando cenas com muita potência. 

O filme foi premiado no ano de seu lançamento no Festival de Cannes por sua direção e encontra-se disponível no Brasil através da HBO Go.

Gummo (1997)

Se você tem estômago fraco, esse filme não é para você. O filme altamente transgressor e quase distópico de Harmony Korine traz um retrato pouco palatável do que é ser um white trash, termo utilizado para se referir a classe de pessoas brancas marginalizadas e com pouca ou nenhuma instrução. A narrativa está ali, mas não há necessariamente um caminho. O que existe é uma sucessão de enredos que testam o nível de repulsa do espectador e nos fazem questionar os limites do ser humano quando ele sente que não tem nada a perder. O cenário é uma cidade que “sobreviveu” após a passagem de um furacão e ao longo do filme acompanhamos um dia corriqueiro de dois amigos que dividem seu tempo entre usar droga barata e cometer crimes contra animais. A exploração sexual e assédio também são abordados ao longo do filme, que abre mão de qualquer filtro ou pudor para nos poupar de algum desconforto, pelo contrário, esse parece ser o efeito a ser instigado. Pode soar como sadismo indicar para alguém esse filme, o fato é que o cinema em sua condição de Arte, não deve necessariamente ser um objeto de contemplação, ele pode servir como um instrumento de denúncia ou representação pura de uma sociedade. Podemos facilmente ignorar  a obra de Korine, mas não é tão simples ignorar a realidade. 

O filme encontra-se disponível somente na Amazon Prime estadunidense.

Discolagem

Se você também é fã de música e cinema, essa coluna é ideal pra você. Se às vezes bate aquela dúvida sobre qual filme assistir ou aquele cansaço de ouvir sempre as mesmas cinco músicas da sua playlist, então toda quarta, quem sabe, eu possa te ajudar. Cada semana vai ter um texto novo sobre aquele filme que você precisa ver, um artista que mais gente precisa conhecer, ou um álbum que você vai gostar de ouvir. Ah! E a coluna se chama Discolagem, salva aí pra não esquecer.

Por Bryan C
05/05/2021 19h20