Da força ao movimento, do barulho à energia vital, as águas do Paraná inspiram artistas das mais diferentes vertentes. Seja o Rio Paraná, que nomeia o estado e cruza fronteiras, ou ainda os rios canalizados de Curitiba, as correntes do estado se tornam versos, fotos, vídeos, performances e até livros premiados.
Lançado em maio, “Tão Grande Quanto o Mar”, de Leomir Bruch, resgata um acontecimento de mais de 40 anos no Rio Paraná: o desaparecimento das Sete Quedas. As Sete Quedas do Rio Paraná formavam um ponto turístico da cidade de Guaíra, um agrupamento de saltos cujo volume de água era maior do que as mundialmente famosas Cataratas do Niágara (EUA). Em 1982, foram soterradas pelo alagamento que formou o Lago de Itaipu, na construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu. Mas pouco se fala sobre o ocorrido, o narrador de histórias e encadernador artesanal afirma.
“A primeira vez que vi as Sete Quedas foi numa foto na biblioteca da escola”, Bruch conta. O artista é natural de Palotina, cidade do interior oeste do Paraná e vizinha de Guaíra, onde ficava esse importante monumento natural. Foi um momento de duplo despertar: para a consciência das quedas e para a literatura. “A professora Adriana, que me introduziu ao universo da literatura, disse que eram as Sete Quedas e que já não existiam mais, o que não fazia sentido na minha cabeça de criança. Como algo da natureza, aquele rio tão grande com grandes cachoeiras, as quedas imensas, não existia mais?”.
Leomir narra que não teve, na educação formal, informações sobre as quedas: “Convivi com essa ausência durante anos”. Em 2018, em contato com Anadir Fochezatto do Sítio Paraná, produtora agroecológica e de uma das famílias afetadas pela construção da barragem, retomou o tema. “Ali me reconectei com essa história. Essa ausência fez um barulho muito grande dentro de mim. O fato de uma família ter que migrar e passar a fazer parte de movimentos de justiça social para serem devidamente indenizados por esse processo”, revela.
A população indígena do estado também foi afetada, o que aparece no livro em citações a nomes como Ailton Krenak. “Os povos indígenas foram dizimados na história do Paraná, destituídos desses espaços que é deles. Há várias denúncias da época sobre aldeias queimadas para forçar a migração dos indígenas, que não aceitavam acordos para saírem do território. As comportas da hidrelétrica são abertas em 1982, mas as construções começaram antes, durante a ditadura militar”, o autor discute.
A presença indígena acaba sendo esquecida ainda mais do que o rio. “Paraná é uma palavra indígena. O título é, entre muitas aspas, a tradução do que seria Paraná, essa imensidão de um rio tão grande quanto o mar. Devo aos povos indígenas desde o nome, essa história, até aos modos de percepção e relação com o rio”, Bruch afirma. “É o segundo maior rio da América do Sul, só menor do que o Amazonas, e não falamos disso. É um rio fronteira que banha Brasil, Paraguai e Argentina. Nomeia um estado super importante pensando a nível nacional em questões econômica e cultural, e não pensamos no que nomeia o estado”.
Na época, os artistas não só do Paraná como de outros cantos do Brasil se mobilizaram contra a construção da hidrelétrica. O evento Quarup: Sete Quedas Viverá, inspirado em ritual indígena de homenagem aos mortos, durou três dias (entre 23 e 25 de julho de 1982). Cerca de cinco mil pessoas, entre ambientalistas, intelectuais, artistas e moradores das regiões afetadas estiveram presentes.
Uma das obras mais marcantes relacionadas ao desaparecimento das Sete Quedas foi o poema de Carlos Drummond de Andrade, “Adeus a Sete Quedas”, publicado em 9 de setembro daquele ano no Jornal do Brasil. Outras artes também registraram o acontecimento, como a música “Adeus Sete Quedas” do grupo Blindagem. Até artistas de outros países se inspiraram no fato, como a escritora peruana Gloria Kirinus, que relacionou as quedas com figuras mitológicas no livro infantil “Sete Quedas, Sete Anões e Um Dragão”.
O desaparecimento das Sete Quedas também aparece em outra narrativa recente, o livro “Extremo Oeste”, de Paulo Fehlauer. No livro, vencedor do VI Prêmio Cepe Nacional de Literatura na categoria Romance e primeiro vencedor do Prêmio Jabuti na nova categoria Escritor Estreante, o desaparecimento de um amigo de infância leva o narrador a buscar diários, cartas e imagens do passado para resolver esse mistério. “As Sete Quedas e o lago de Itaipu operam no romance como um lugar ao mesmo tempo mítico e concreto a partir do qual a narrativa se desenrola”, explica o autor. “Concreto porque também funcionam como pano de fundo para a trama. Mítico porque há a recuperação de uma memória sobre sua existência, o seu desaparecimento e o papel que tiveram e seguem tendo no imaginário da população local – dos indígenas aos colonos que ocuparam a região no século XX”.
O romance usa de uma extensa pesquisa em documentos históricos para reconstruir o contexto da época. “Nasci no ano em que as Sete Quedas desapareceram (em Marechal Cândido Rondon, mas passei a infância em Palotina), então não tive a oportunidade de vê-las pessoalmente, mas cresci olhando para álbuns de fotografias e ouvindo histórias”, Paulo discorre. “Por conta disso, as Sete Quedas sempre tiveram para mim o sentido de um ‘futuro pretérito’: um lugar mítico que me fazia imaginar o que teria sido da minha infância e do oeste do Paraná se elas ainda existissem”.
A questão fronteiriça que o rio traz também perpassa as narrativas. No livro de Leomir, o portunhol cruza os textos como um rio que banha diferentes margens. “A família usa o portunhol como forma de expressão, por estar muitos anos dentro do Paraguai, nesse trânsito que vai se mesclando com paraguaios e outros imigrantes naquele espaço. É a língua que fala esse rio”, afirma. Fehlauer traz para “Extremo Oeste” as tensões das fronteiras: “O ‘clique’ para escrever a história ocorreu no momento em que percebi aquele território como uma espécie de vértice para onde convergem diversas tensões que perduram há muito tempo no Brasil e na América Latina, como a questão fundiária e indígena, a ocupação desordenada e a nossa relação obtusa com a memória. Enxergar todas essas camadas sobrepostas no meu próprio quintal foi o que me estimulou a escrever o romance”.
Outro estímulo sensorial intrínseco aos rios é o barulho, que consegue penetrar camadas sensíveis da arte na música e na escrita. “Dizem que o som das sete quedas era ouvido a 30 km de distância de Guaíra. No dia 13 de outubro de 1982, esse som sessou. Quando são abertas as comportas da hidrelétrica de Itaipu, as sete quedas são cobertas, e 14 dias depois, elas não existem mais. Então fico imaginando o silêncio dessa cidade. O desejo desse livro também é fazer jus ao barulho, ao som”, Bruch explica. “É um canto ao rio, continuar ecoando o canto dessas sete quedas”.
Na epígrafe do livro, Leomir cita a música “Águas Passadas Me Movem”, do locutor e produtor cultural Heitor Humberto. Escrita há 11 anos, a canção ficou de fora do disco da Banda Gentileza, da qual o músico fazia parte, e acabou sendo a primeira a ser lançada no trabalho solo de Humberto. “Fiquei me imaginando nadando pra criar imagens que poderiam me inspirar a escrever. E acho que a partir daí surgiram umas metáforas legais, que até hoje gosto bastante. Nesse caso, foi menos a força da água que inspirou a música, e mais o fluxo e a constância dela”, revela.
Humberto, não lembrava da história das Sete Quedas até se conectar ao livro. “Quando Leomir estava apresentando a obra no lançamento, ele exibiu uma foto. Na hora, me lembrei daquela imagem, que estava em alguma memória da minha infância”, afirma. O diálogo entre as obras conectou os artistas, num fluxo criativo. “É uma coincidência temática incrível. Afinal, as memórias das Sete Quedas são águas passadas, mas que movem o trabalho do Leomir. É bonito ver como esses rios se encontraram no percurso”, confessa o produtor cultural.
Outra citação em “Tão Grande Quanto o Mar” é o Rio Belém. Entre 2021 e 2022, Bruch criou uma performance de rua que levou para espaços onde o rio está coberto por concreto, “para devolver para a cidade a imagem desse rio, ainda que simbólica”, define. Uma bandeira com a frase “Aqui antes um rio” foi fotografada em espaços por Curitiba onde passam rios canalizados. O trabalho foi recriado para o projeto Rios Invisíveis, no ano passado.
O Rio Belém é tema do documentário “Das Águas – Um Manifesto do Rio Belém”, da fotógrafa e estudante de Geografia e dos cursos técnicos de Meio Ambiente e Produção de Áudio e Vídeo Alina Gabardo. Ao descobrir que embaixo da Av. Vicente Machado passa o Rio Ivo, começou a se interessar pelos córregos da cidade. “Fiquei chocada com a possibilidade nada natural de, além de canalizar um rio, ainda pavimentar em cima dele. Minha visão de cidade ecológica mudou completamente, e sempre me coloco na perspectiva de um rio que foi sufocado e invisibilizado a ponto de inúmeras pessoas passarem por cima dele sem saber”, conta Alina.
A fotógrafa também fez percursos dentro da cidade, descobrindo a nascente de rios que cruzam Curitiba. “Cheguei em alguns pontos que me impressionaram com o quanto a cidade negligencia suas águas”, confessa. Estagiária do Instituto de Água e Terra do Paraná, conheceu mais sobre o Rio Belém, que tem sua nascente e foz dentro da cidade. “Através do percurso do Rio Belém, a história de Curitiba está diretamente ligada às águas que foram cruciais para a construção deste espaço e hoje são vistas como um problema”, comenta a artista. A canalização de rios e o descaso com seus percursos acabam tendo consequências sociais e ecológicas.
“Sinto que a cidade não olha para seus rios, e isso fica claro ao vê-los pavimentados e canalizados”, explica Alina sobre a inspiração para o documentário, com previsão de estreia em 25 de junho. “E, quanto menos se vê, menos se conhece, menos se entende e menos se tem um sentimento de pertencimento. É fácil olhar para as águas e achar que ali existe um problema, ou por conta do cheiro quando se nota que existe ainda muito esgoto indo para essas águas, ou quando se tem enchentes que é uma questão clara de como a cidade não se relaciona com o rio”.
Os rios foram essenciais na construção do Paraná como estado, desde a cultura à economia. Seja pela força da natureza ou pela urgência de questões socioambientais, da metáfora até a real ausência de suas águas, as correntes desembocam em criações potentes, lembrando da nossa relação com os rios. “Independente do que acontece, o rio está ali. Esse rio que toma aquele espaço dele de volta, que a gente como cidade criou barragem, canalizou, e quando chove, transborda. Esse é o movimento dele, de cheia e de recolhimento. Apesar de tudo, o rio segue no seu fluxo”, finaliza Bruch.
Data de Lançamento: 03 de outubro
Em Monster Summer, dirigido por David Henrie, é uma aventura de terror e mistério que vai trazer a narrativa de uma Noah (Mason Thames) e seus amigos que, após uma força misteriosa começa a atrapalhar a diversão de virão do grupo, eles se unem a um detetive policial aposentado, o Gene (Mel Gibson), para que juntos possam embarcar em uma emocionante aventura com a intenção de salvar sua ilha, que até então era calma e pacífica.
Data de Lançamento: 03 de outubro
Em Coringa 2, acompanhamos a sequência do longa sobre Arthur Fleck (Joaquin Phoenix), que trabalhava como palhaço para uma agência de talentos e precisou lidar desde sempre com seus problemas mentais. Vindo de uma origem familiar complicada, sua personalidade nada convencional o fez ser demitido do emprego, e, numa reação a essa e tantas outras infelicidades em sua vida, ele assumiu uma postura violenta – e se tornou o Coringa. A continuação se passa depois dos acontecimentos do filme de 2019, após ser iniciado um movimento popular contra a elite de Gotham City, revolução esta, que teve o Coringa como seu maior representante.