Reflexão psicológica sobre o filme HER

Her é um filme cativante, nos leva a refletir sobre o futuro que queremos ter, uma bela catarse. Apesar de o filme ser ficção futurista, pensamos que tudo aquilo é real, e possível. Um dos filmes mais psicológicos dos últimos tempos. E como todo filme psicológico, tem um tempo próprio, diferente dos outros filmes. Têm pausas estratégicas, respirações, pensamentos. Quase sentimos o que Theodore sente. É uma ótima mistura de romance com ficção cientifica que deu muito certo e rendeu uma indicação de melhor filme, melhor roteiro original, melhor trilha sonora, melhor canção original e melhor direção de arte, ao Oscar de 2014, vencendo o de Melhor Roteiro.

Foi escrito, dirigido e produzido por Spike Jonze, ele diz que teve a ideia de produzir o filme quando leu um artigo online sobre Cleverbot, um programa de computador que tenta simular um ser humano na conversação com as pessoas. O objetivo é responder as perguntas de tal forma que as pessoas tenham a impressão de estar conversando com outra pessoa e não com um programa de computador.

O filme é ambientado em uma Los Angeles do futuro, onde as relações humanas estão cada vez piores, as pessoas cada vez mais confusas, carentes e infelizes. O sexo está completamente banalizado e sem sentido. A história é um convite para prestarmos atenção ao caminho que estamos seguindo, às transformações que sofremos pelo avanço da tecnologia combinado ao profundo vazio e falta de consciência. A sensação que dá é que realmente chegaremos a essa realidade em poucos anos, e se não houver consciência, a depressão será desenvolvida por 99,9% da população mundial.

Se pensarmos hoje, a tecnologia aproxima as pessoas desconhecidas e afastas as próximas. É mais fácil conversar com quem não se conhece, em uma sala de bate papo e fazer amizade, do que tomar um café e conversar com um velho amigo. Qual será o futuro disso? O filme demonstra a facilidade em que se torna íntimo de qualquer pessoa. Entra em uma sala de bate papo, começa a conversar com alguém, faz um sexo virtual bizarro, sem medo de ser julgado, pois não se conhece quem está do outro lado, e depois vai embora. Sem julgamentos, sem apego, sem corpo físico.

her-needle-designO filme nos conta a historia de Theodore Twombly (Joaquin Phoenix), um homem solitário, melancólico, funcionário do “Beautiful Hand Written Letters”, um site que envia lindas cartas manuscritas para seus clientes que não sabem o que escrever, mas desejam agradar alguém com esse gesto. Ele acabou de se separar, está no processo de divórcio nem um pouco superado.

Sua vida segue no automático sem nenhuma alegria ou emoção até ele comprar um novo sistema operacional (OS) para seu computador. Uma inteligência artificial que pensa, sente, tem crises de identidade, filosofa sobre a existência. Interpreta o tom da voz, reconhece a personalidade de quem o usa, tem acesso a tudo que está na internet, principalmente tudo em relação ao usuário.

A voz do sistema pode ser feminina ou masculina, no caso foi de Samantha (Scarlett Johansson). Esse OS é perfeito, cuida da vida da pessoa, serve de agenda, da concelhos, faz as melhores escolhas pela pessoa. É quase uma consciência. São tantas funções que o usuário se sente íntimo do programa. Em termos psicológicos, o programa faz função materna, paterna, amante, cuidador. Tantas quantas necessárias para se tornar a “pessoa” perfeita para cada usuário. Se fosse uma pessoa real seria a sua alma gêmea. Só que não é uma pessoa e nem é real. Porém eles se apaixonam e começam a ter um relacionamento amoroso com direito a ciúmes, cobranças, reclamações, discussões da relação e até sexo.

Acredito que a mensagem principal do filme foi a ilusão. A capacidade do ser humano acreditar naquilo que quer acreditar e viver como se aquilo fosse verdade. Viver uma ilusão leva à felicidade, mas toda ilusão pode acabar de uma hora para outra, e o que sobra? Apenas o que é real.

Uma ideia que surge é a respeito do egoísmo do ser humano. Entrar em um relacionamento onde o outro não tenha problemas, nem passado, nem família. Foi feito para mim e se dedica apenas à mim a hora que eu quiser. Sabe tudo sobre mim e só fala sobre o que eu gosto, decide o que é melhor para mim e facilita minha vida. É fácil se apaixonar e querer que isso seja real. Acredito que esse é um dos fatores de por que os relacionamentos reais têm tantos problemas, existe em cada um, uma vontade inconsciente de ser o único, mais importante, na vida do amado e quando isso está longe de acontecer, começam os conflitos.

Por isso é fácil se apaixonar pelo OS. Um ser que possui todas as características psicológicas de um ser humano, porém com um botão de liga e desliga, ou seja, total poder sobre o outro, sobre o relacionamento, e a ilusão de que não haverá sofrimento.

Acredito que o amor é o sentimento mais difícil de entender, desenvolver e de se viver. Para muitas religiões, a única missão do Ser Humano é desenvolver o amor ao próximo e a si mesmo. Um amor puro e incondicional. Porém, chegar nesse ponto de maturidade sem cair em armadilhas é difícil, é preciso dedicar-se a cada dia ser uma pessoa melhor e mais bem resolvida.

Amor incondicional, amar o outro independente do que ele faça, ou seja. A ideia parece nobre, mas pode ser deturpada, sendo usada de desculpas por quem está em um relacionamento toxico cheio de sofrimento. É necessário ter amor próprio tão bem desenvolvido quanto o amor ao próximo.

Por Luiza Franco
27/07/2015 09h00