5º Olhar de Cinema: O desafio do desconhecido

O interessante dos festivais de cinema é que eles são plurais na oferta de títulos – e isso recai sobre o público que precisa se aventurar pelas opções sem muito conhecimento sobre o que se escolhe. Isso, por si só, é um exercício intuitivo, de juntar as pontas do que se tem sobre o conhecimento de mundo de cada um e aquilo que o filme entrega na prática. Desafiador.

Peguei-me surpreendido com os dois filmes que escolhi no terceiro dia do festival. O primeiro “Oleg e as artes raras” me pôs em êxtase. O documentário intercala depoimentos do pianista russo Oleg Nikolaevitch Karavaychuk sobre a atual produção musical com, claro, o músico atuando em seu instrumento com a perfeição de quem é um dos melhores do mundo – mesmo aos 88 anos. Um deleite. Oleg tem voz mansa, caminha com cuidado, é frágil e delicado na maneira e no porte. Ao piano, muda de figura. É austero, imponente, domina de olho fechados – literalmente – o dom de fazer do piano uma extensão de suas mãos. Reinventa a música clássica ao tempo em que relembra amores, lugares e partituras. É como se Oleg tivesse em todas as facetas de sua personalidade uma intervenção de sua arte. É como se hoje ele vivesse para traçar paralelos entre o mundo e seu piano. Ao público do festival não restou outra reação se não – assim como em um teatro – o aplauso ao final da apresentação.

Oleg e as artes raras

O “O homem roubado” teve reação inversa. O cinema argentino é hoje um dos melhores do mundo – e foi nessa expectativa que o público decidiu acompanhar o longa. O festival se propõe a exibir todas as obras do cineasta Matías Piñeiro, sendo esta a primeira, de 2007. Um bom exercício para quem se interessa em acompanhar a evolução do diretor com o passar dos anos. Rodado em PB em uma Buenos Aires pouco atrativa, o longa percorre as aventuras de uma jovem guia de um museu e seus relacionamentos com os amigos. Ela percorre o longa fazendo a leitura da obra Campaña del Ejército Grande, de Domingo Faustino Sarmiento ao tempo que traça paralelos entre os escritos e as histórias que observa. Talvez a pouca intimidade com essa faceta da cultura argentina fez o público cansar; parte dele abandonou a sessão antes do fim. Quem ainda for ao festival – ele vai até quarta – vale o esforço em ver a evolução do diretor nas obras subsequentes a “O homem roubado”, que se a estreia fosse hoje, no Brasil, não teria tanto retorno.

Por William Saab
13/06/2016 12h32