Eles vivem sem mim.

Quando o médico me disse que ia me prescrever remédio pra dormir fiquei bem contrariada. Não tomei nas primeiras noites. Depois, quando dia e noite começou a virar tudo a mesma coisa, me rendi aos trocentos anos de formação do meu Dotô e tomei o tal remédio.

Ele me bota em transe e eu apago mesmo. Não estou feliz com isso, mas pelo menos estou descansada. Todo mundo em casa já acostumou que minha vida útil depois que eu engulo a “pírula” é de vinte minutos.

Uma vez, na véspera de um feriadão, antes da pandemia, estava aquele fervo em casa porque a gente ia viajar. Eu sempre me estressava antes de viagem porque tinha que fazer a minha mala, a da Lara, a do Teo, a de banho, a de remédios, a de brinquedos, a de lanche para a estrada… era uma infinidade de malas e sacolas.

Só que eu estava meio p da cara nesse dia e, a partir de um ato friamente calculado de rebeldia, acabei descobrindo que o abençoado remedin, além de me fazer dormir, me liberta pra c@<€+€.

Dei janta pra criançada, arrumei a minha mala e, sem olhar no relógio, botei pra dentro os meus 10mg de sono. Quando me viram engolir, o quarto silenciou e a galera estalou o olho meio desesperada.

– o que vc tomou?

– meu remédio de dormir, ué!

– como assim? São só 9 horas. É cedo. Temos que fazer isso, aquilo, falta bla bla bla bla.

– desculpaí. Já engoli. (provei colocando a língua pra fora)

Sabe o que aconteceu? Acordei no dia seguinte e estavam todos vivos. Malas e sacolas prontas.

Pqp, eles vivem sem mim e a casa não alaga, não pega fogo, não desmorona quando não estou olhando. Que bela lição de humildade eu tomei.

Mães, profissionais, donas de casa, esposas, mulheres maravilha, não esperem precisar de recomendação médica, podem usar sem medo o botaozinho off que a família inteira sobrevive.

Por Luciane Krobel
05/07/2021 18h40