Aretha, a Lady Soul

Carole King levantou-se para saudar quem entrava no palco. Carole era a grande homenageada naquela noite do dia 6 de dezembro de 2015. O 38º Kennedy Centers Honors, como de costume, honrava nomes pela sua contribuição a cultura americana. Lá estavam, como também é de praxe, pessoas relevantes e celebridades – tanto na platéia, quanto no palco. Carole, uma das maiores compositoras norte-americanas, não conteve a emoção ao assistir aquela performance em seu tributo. Até mesmo o presidente estadunidense Barack Obama deixou escapar algumas lágrimas. Todos naquele teatro foram arrebatados pela presença gigante daquela mulher no palco. Embasbacados, eram dominados pela incrível voz daquela senhora de 73 anos que cantava uma musica co-escrita por King chamada ‘(You Make Me Feel Like) A Natural Woman‘. Lá no palco, primeiro no piano e depois em pé, uma força que somente alguém condecorada com o título de Rainha do Soul poderia ter. Ela, Aretha Franklin.

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Aretha Louise Franklin nasceu no dia 25 de março de 1942 em Memphis e foi criada em Detroit. Ela ainda era uma jovem menina de 14 anos quando lançou o seu primeiro disco. ‘Songs of Faith‘, de 1956, revela muito sobre as origens de Aretha. O disco foi gravado na New Bethel Baptist Church, Igreja de seu pai, o Referendo C. L. Franklin. No disco, uma força inacreditável para alguém tão jovem. A voz e o piano de Aretha, que enchem de força as músicas inspiradas nos Evangelhos, fazem os presentes na Igreja no dia daquela gravação não conterem a emoção. Talvez eles ainda não imaginassem, mas certamente sentiram que aquela menina tornaria-se uma das maiores cantoras de todos os tempos.

O talento de Aretha logo começou a chamar a atenção. E aos 18 anos ela assinou contrato com a Columbia Records. Após consolidar suas raízes no gospel, Aretha, inspirada pelo Sam Cooke, queria começar a dar passos em direção ao pop. Em 1960, seu primeiro single pela Columbia é lançado: ‘Today I Sing the Blues‘. Esse período ficaria marcado pelos primeiros passos de Aretha rumo ao estrelato e a sucessos como ‘It Won’t Be Long‘ e ‘Rock-A-Bye Your Baby With a Dixie Melody‘. Outra marca desse período, porém, foi a insistência da Columbia com produções e escolhas que não exploravam ao máximo o potencial de Aretha. Por isso, quando a Columbia tentou renovar o contrato em 1966 teve que escutar um “não” da mulher que caminhava em direção ao trono do Soul. Foi aí que uma outra gravadora, ciente do enorme talento de Aretha, ofereceu a ela a oportunidade de compor, tocar piano e cantar com suas irmãs fazendo as vozes de apoio com pitadas de golpel, soul e funk. Aí não teve jeito e em 1967 Aretha já gravava pela Atlantic Records.

Com o apoio do lendário produtor Jerry Wexler, Aretha foi até o Alabama e, cercada de ótimos músicos, sentou-se na frente do piano para tocar e cantar. O resultado foi ‘I Never Loved a Man (The Way I Love You)‘. Todos os envolvidos no projeto sentiram a mágica no ar e tiveram certeza que estavam prestes a construir coisas enormes. Entre elas, uma música que marcaria a época também dentro dos movimentos sociais. O pai Aretha foi um dos mais influentes padres negros dos EUA, e por isso tinha contato próximo com diversos líderes, pensadores e pessoas influentes do movimento do Civil Rights. Por isso não foi mera coincidência Aretha, que cresceu tendo contato com nomes como Martin Luther King Jr., gravar e alçar a categoria de clássico máximo ‘Respect‘, canção de Otis Redding. A versão em alta voltagem de Aretha foi eternizada também nos protestos pela igualdade. Essas músicas, e também outras como a poderosa ‘Do Right Woman, Do Right Man‘, fizeram parte do disco de estreia – “I Never Loved a Man (The Way I Love You)” – de Aretha Franklin pela Atlantic, em 1967. Neste mesmo ano, embalada pelo seu grande sucesso, ela lançaria o disco “Aretha Arrives“. O disco comprova a grande forma de Aretha, tanto nos vocais quanto nos pianos e prepara o terreno para o disco que viria para deixar claro quem era Aretha Franklin. Ela era a Lady Soul.

Lançado no dia 22 de janeiro de 1968, Lady Soul é um daqueles discos que conseguem transbordar a essência de um artista genial no melhor de sua forma. Lady Soul é, música após música, a força e o poder de uma das mais incríveis artistas que já viveram. O tremolo da guitarra da espaço para a explosão de ritmo de ‘Chain of Fools‘, música que abre o disco. A sonoridade orgânica realça a essência do som e o incrível time de músicos presentes – nomes como Bobby Womack, King Curtis e Eric Clapton. O disco é recheado de performances incríveis de Aretha e de excelentes composições. Algumas músicas são  da própria Aretha, como ‘Ain’t No Way‘ e ‘Good To Me As I Am To You’. Outras de outros grandes compositores como Curtis Mayfield (‘People Get Ready‘), James Brown (‘Money Won’t Change You‘) e Ray Charles (‘Come Back Baby‘).

E uma das músicas mais marcantes deste disco, que faz parte do acervo de músicas definitivas da história, foi fruto de uma sugestão de Jerry Wexler a dois compositores, Gerry Goffin e Carole King. E, com a visão da “natural woman” em mente, eles escreveram um clássico que Aretha eternizou brilhantemente. Prova disso é, 47 anos após o lançamento da canção, Aretha conseguir emocionar o mundo com uma performance de ‘(You Make Me Feel Like) A Natural Woman’, no Kennedy Centers Honors.

Não é preciso dizer que Aretha Franklin foi um dos nomes de maior sucesso, em todos os sentidos, da história da música. Sua incrível habilidade musical, sua voz enorme e sua presença gigante a colocaram não somente no posto de Rainha do Soul, mas também como uma das magestades máximas da música.

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Por Vinicius Vianna
28/03/2016 13h21