Deborah Colker faz em “Cão sem Plumas”, baseado no poema homônimo de João Cabral de Melo Neto (1920-1999), seu primeiro espetáculo de temática explicitamente brasileira. A Cia. de Dança Deborah Colker, que conta com o patrocínio da Petrobras desde 1995, faz única apresentação do espetáculo em Curitiba, no palco do Guairão, no dia 1.º de novembro. Os ingressos estão à venda a partir de R$45.
Publicado em 1950, o poema acompanha o percurso do rio Capibaribe, que corta boa parte do estado de Pernambuco. Mostra a pobreza da população ribeirinha, o descaso das elites, a vida no mangue, de “força invencível e anônima”. A imagem do “cão sem plumas” serve para o rio e para as pessoas que vivem no seu entorno. “O espetáculo é sobre coisas inconcebíveis, que não deveriam ser permitidas. É contra a ignorância humana. Destruir a natureza, as crianças, o que é cheio de vida”, diz Deborah. A dança se mistura com o cinema. Cenas de um filme realizado por Deborah e pelo pernambucano Cláudio Assis – diretor de longas-metragens como “Amarelo Manga”, “Febre do Rato” e “Big Jato” – são projetadas no fundo do palco e dialogam com os corpos dos 13 bailarinos.
As imagens foram registradas em novembro de 2016, quando a coreógrafa, cineasta e toda a companhia viajaram durante 24 dias do limite entre sertão e agreste até Recife. A jornada também foi documentada pelo fotógrafo Cafi, nascido em Pernambuco. Na trilha sonora original estão mais dois pernambucanos: Jorge Dü Peixe, da banda Nação Zumbi e um dos expoentes do movimento mangue beat, e Lirinha (ex-cantor do Cordel do Fogo Encantado, poeta e ator), além do carioca Berna Ceppas, que acompanha Deborah desde o trabalho de estreia, Vulcão (1994). Outros antigos parceiros estão em cenografia e direção de arte (Gringo Cardia) e na iluminação (Jorginho de Carvalho). Os figurinos são de Claudia Kopke. A direção executiva é de João Elias, fundador da companhia.
Os bailarinos se cobrem de lama, alusão às paisagens que o poema descreve, e seus passos evocam os caranguejos. O animal que vive no mangue está nas ideias do geógrafo Josué de Castro (1908-1973), autor de “Geografia da fome” e “Homens e caranguejos”, e do cantor e compositor Chico Science (1966-1997), principal nome do mangue beat. O movimento mesclava regional e universal, tradição e tecnologia. Como Deborah faz. Para construir um bicho-homem, conceito que é base de toda a coreografia, a artista não se baseou apenas em manifestações que são fortes em Pernambuco, como maracatu e coco. Também se valeu de samba, jogo, kuduro e outras danças populares. “Minha história é uma história de misturas”, afirma ela.
Seu grupo se firmou como fenômeno pop em “Velox” (1995), “Rota” (1997) e “Casa” (1999). Os espetáculos “Nó” (2005), “Cruel” (2008), “Tatyana” (2011) e “Belle” (2014) trataram de temas existenciais, como os afetos. Em “Cão sem plumas”, Deborah reúne aspectos de toda a sua carreira. “Cabem a elegância do clássico, a lama das raízes e o olhar contemporâneo. O nome disso é João Cabral”, diz ela. Reconhecida internacionalmente, Deborah recebeu em 2001 o Laurence Olivier Award na categoria Oustanding Achievement in Dance (realização mais notável em dança no mundo). Em 2009, criou um espetáculo para o Cirque de Soleil: “Ovo”. Em 2016, foi a diretora de movimento da cerimônia de abertura das Olimpíadas do Rio de Janeiro. João Cabral vivia em Barcelona, como diplomata, quando leu numa revista que a expectativa de vida no Recife era menor do que na Índia. A notícia foi o impulso para fazer “O cão sem plumas”. Publicou em 1953 “O rio ou Relação da viagem que faz o Capibaribe de sua nascente à cidade do Recife” e, três anos depois, sua obra mais conhecida, “Morte e Vida Severina”. Sua poesia, das mais importantes do Brasil, é marcada pelo rigor e pela rejeição a sentimentalismos.
Quando: 01 de novembro de 2017 (quarta-feira)
Onde: Teatro Guaíra (Praça Santos Andrade, s/n)
Horário: 21h
Quanto: variam de R$45 a R$120
Vendas: Disk Ingressos
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