Crítica: contemplativo “Praia Formosa” chega aos cinemas nesta quinta (28)

Filme Praia Formosa. Foto: Divulgação.
Foto: Divulgação

A anacrônica jornada pela ancestralidade de “Praia Formosa” chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (28/11). O longa-metragem de Julia de Simone circulou por festivais com destaque, conquistando inclusive prêmios como Melhor Direção de Arte (Ana Paula Cardoso) e Melhor Direção de Fotografia (Flávio Rebouças) no Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.

O longa destaca Muanza, mulher do Reino do Congo trazida para o Brasil na condição de escravizada no século XIX. Ela se vê transportada para o Rio de Janeiro dos dias atuais, caminhando por esses diferentes momentos temporais em uma cidade que redescobre sua história. Nas duas linhas temporais, ela procura por Kieza, uma simbólica busca pelo outro, pela família formada na dor da escravidão. A trama remete ao livro “Kindred: Laços de Sangue”, de Octavia E. Butler, às avessas. O aclamado romance da escritora norte-americana leva uma mulher negra de volta ao passado, descobrindo suas origens escravocratas, em uma viagem temporal misteriosa. No filme, a jornada pelo tempo também tem origem incerta, mas leva Muanza a entender o impacto do passado no que será o futuro. O que as Kiezas do futuro levam da ancestralidade de Muanza?

Muanza

O trabalho da atriz principal Lucilia Raimundo é muito bom, dedicado especialmente ao aspecto físico. Com o corpo, ela consegue representar a revolta silenciosa, a busca por movimento e conexão e o desejo de se transportar para uma liberdade. É no corpo negro que se vê o poder de Muanza e é com ele que ela resiste, das tranças à dança, que servem como veículo de uma viagem no tempo.

O longa por vezes é contemplativo, desde representando paisagens até cenas de poucas falas e longa exposição. O jogo cênico da escravizada com a patroa é dinâmico e forte. O cenário do casarão ruindo aos poucos também traz potência para as cenas. O ar misterioso sobre o que acontece de fato é mantido durante todo o filme. O clima parece flutuar entre um suspense fantasmagórico e um filme de vingança. Mas a vingança de Muanza é nos detalhes, na promessa de escapatória iminente.

Praia Formosa” evoca pesquisas históricas, corporificando descobertas arqueológicas e sociais de um passado mal resolvido. As tranças como forma de resistência, mapas para a liberdade, e o uso de línguas kikongo e kimbundo, ressaltam essa pesquisa.

Formato

O formato mais quadrado da imagem força uma escolha estética de passado, mas que já estava melhor demonstrada na casa – essa sim, muito bem aproveitada. Os encontros de passado e presente nos corredores são bem construídos. A segunda parte do filme perde a força da atuação que vinha sendo construída no início, e o texto esbarra no didatismo. Ainda assim, consegue representar ficcionalmente o que o resgate, não apenas histórico, mas também simbólico das culturas africanas escravizadas significa para o Brasil de hoje.

Por Brunow Camman
28/11/2024 13h45

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