Banda Waves.docx

foto: Canva

Praia bastante vazia. Um guarda-sol com duas pessoas. Uma guria com cadeira quase dentro do mar. Ajeito a ecobag no ombro e sigo na areia quente me distanciando ainda mais de qualquer ser humano. Num ponto seco já perto da água, estendo a canga.

A brisa carrega o cheiro de maresia temperada com meu protetor solar. Dou uma alongada, puxo forte o ar trazendo pra dentro a sensação de limpeza, e tiro o camisetão. Daí sento e vasculho a ecobag atrás do cigarro. Pego o livro e jogo na canga — cai no limite com a areia. Encontro cigarro e isqueiro e só após várias tentativas de conchinha com a mão, acendo.

Fico ali no traga e solta de fumaça mentolada, observando sem reparar o vai-e-vem das ondas. Ouvindo as cristas que formam e quebram num ritmo hipnótico. Tá aí disparado o melhor hit da natureza.

Apago o cigarro e guardo a bituca dentro do tubinho plástico de M&Ms. De barriga pra baixo, desamarro as duas fitas da parte de cima do biquíni e fico lagarteando — bochecha na camiseta que improvisei de travesseiro, a banda Waves no fundo.

Cochilo no sol fervendo a pele, o suor acumulado atrás dos joelhos e na pocinha da lombar. Até que toca o despertador: a caixinha de som torando da galerinha desgraçada que surgiu no meu paraíso.

São cinco. Estão longe e nem consigo ver rostos. Mas os decibéis da batida eletrônica que nada tem a ver com a quebrada das ondas ruinam a natureza.

Fico puta, irritadíssima. Com a música bad vibes. Com a impossibilidade de conseguir fazer algo. Sento abandonando a parte de cima do biquíni e procuro na bolsa o celular, e fone. Enterro nos ouvidos os dispositivos plásticos numa playlist de som do mar. Costas esparramadas na canga, pego o livro tentando acreditar na realidade descompensada que ouço.

Quatro páginas, e duas gurias da equipe demônia passam perto de mim no caminho pra um mergulho. Estou concentrada no final do capítulo, livro suspenso no ar pelos braços, até que as gurias se materializam do meu lado. Acho que foi só xixi.

Continuo deitada, o livro suspenso agora só por uma mão e com a outra eu tiro um dos fones. Aí elas falam sem efetivamente perguntar se eu posso cobrir meus peitos, que tá atrapalhando e já vai dar confusão com os piás.

Alguns segundos fico encarando os dois óculos escuros molhados com gotículas mar. Aí volto pra terminar a última frase, e depois desço o livro aberto cobrindo toda aquela indecência. Enfio o fone no ouvido e fecho os olhos numa descansada até me dar vontade do próximo capítulo.

Por Rai Gradowski
31/10/2024 10h52

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