Saindo do Armário: Quem te inspirou a se aceitar?

“Toda noite eu chorava e rezava pra Deus me ‘curar’. Um dia, eu entendi que Ele não me curava porque aquilo não era uma doença”, Junior.

Engana-se quem afirma que a pior luta de um LGBTT é com a aceitação dos outros. Volto a citar aqui uma lição de Nomi Marks, do seriado Sense8: “A verdadeira violência, aquela que percebi ser indesculpável, é a que fazemos com nós mesmos quando temos medo de ser quem realmente somos”.

O Saindo do Armário traz, neste mês, duas histórias: uma de dor e aceitação e outra de amor e descoberta. Junior, 19, compartilha conosco o drama que envolveu a sua aceitação como homossexual e a experiência com o seu primeiro amor. Confira:

Entre a cruz e o arco-íris

Ele era uma criança que se sentia diferente dos outros garotos da sua idade. Não se identificava com aquela competitividade esportiva típica dos meninos e, portanto, só tinha amigas meninas. Ser gay era a resposta que passava pela sua cabeça quando pensava nos motivos da sua “estranheza”. Mas o medo sempre o assustava e ele acabava negando.

Já mais velho, Junior começou a descobrir seu gosto sexual e a assistir pornô gay. Mas se sentir culpado depois do ato virou um hábito. Então, toda noite ele chorava e rezava para Deus “curá-lo”.

O Garçom

Quando ainda morava em SC, aos 16 anos, foi com a família a um restaurante recém inaugurado que ficava atrás da sua casa – a janela do seu quarto dava para os fundos do estabelecimento. Nele havia um garçom com uns 20 anos que, sempre que atendia a mesa de Junior, ficava atrás da cadeira do garoto, com as mãos em seus ombros.

E mesmo quando estava longe, o garçom mantinha os olhos fixados nos seus, quase que flertando.

Naquela primeira noite, Junior foi para o seu quarto e chorou muito. Chorou o dobro. Continuou rezando pedindo pela cura. Foi naquele momento de epifania que ele entendeu: Deus não o curava pois ele não precisava ser curado. E ali, entre lágrimas e descobertas, as coisas mudaram.

Todas os dias, Junior ficava até as 2h da manhã na janela esperando o garçom terminar o turno, pegar a moto e ir embora. Tentou descobrir o nome dele e quem ele era, mas nunca conseguiu. Nunca falou com ele. Era um romance que acontecia apenas na sua cabeça.

Intercâmbio

Naquela mesma época, decidiu fazer intercâmbio. Logo recebeu a notícia de que iria para o Nebraska, nos Estados Unidos. Para se enturmar, começou a procurar intercambistas de lá que estavam indo para outros países. Nessa empreitada, descobriu uma foto com todos os intercambistas e os adicionou no Facebook. Mas apenas dois lhe responderam: uma menina, que virou sua amiga, e Nicholas.

Junior e Nicholas viraram amigos com bastante facilidade. O americano lhe ajudava a praticar inglês pelo Skype e numa dessa conversas, revelaram um ao outro suas orientações sexuais compatíveis.

Ver como Nicholas era assumido, numa cidade de 400 habitantes, em um estado conservador dos EUA, deu-lhe muita força para sair do armário. Contou para a irmã, depois para amigos e a mãe. Não foi fácil, mas todos compreenderam.

Love, Kindness and Friendship

O que Junior sentia por Nicholas representava algo completamente novo, algo que talvez ninguém tivesse lhe proporcionado. Quanto mais o tempo passava, mais próximos ficavam. Mas um relacionamento sério parecia inviável, uma vez que Jr. estava no Nebraska e Nicholas em Taiwan.

Talvez aquele misto de amor, bondade e amizade tenha feito tudo mudar durante o Baile de Homecoming da escola de Jr. No meio da festa, ele recebeu a seguinte mensagem:

“Não importa a distância, eu te amo muito para não ter você como namorado.”

Nicholas impôs o namoro e Jr. gostou daquilo. Nos meses seguintes, mantiveram um relacionamento semi-aberto. Estavam sempre em contato um com o outro. Tinham até um plano em mente: quando Nicholas voltasse do intercâmbio, Jr. passaria alguns dias na casa dele. O único problema seria convencer a organização rígida que o levou para os EUA.

5 dias

O desempenho acadêmico de Jr. ao longo do ano foi fundamental para que sua família e a organização o deixassem fazer aquela viagem para visitar um amigo. O trajeto de 6 horas entre a sua cidade e a de Nicholas pareciam intermináveis. Mas os 5 dias que se seguiram foram os melhores de sua vida.

1 ano e 6 meses

O intercâmbio acabou. Junior se mudou para Curitiba e, depois de mais 9 meses de relacionamento à distância, optou pelo término. O sofrimento foi grande, mas a boa amizade permaneceu. Mais do que isso, Nicholas foi a segunda pessoa responsável pelo amadurecimento pessoal  e sexual de Junior.

Final Feliz

Se essa história tem um final feliz, Jr. gostaria de contá-lo da seguinte forma:

“Conheci um certo alguém aqui na cidade. Essa pessoa é muito especial para mim, e eu me sinto especial para ela. Temos bons tempos juntos.

Nicholas e eu não conversamos mais. Ele não conseguiu suportar me ver com outra pessoa. Ainda acredito que um dia eu e ele possamos ser amigos de novo, mas só quando ele encontrar alguém para ele também.

No momento, estou feliz. Minha vida está onde eu queria: faço faculdade, tenho bastante amigos, moro sozinho e tenho uma pessoa que gosto do meu lado.

Ainda estou descobrindo a minha identidade pessoal, me aceitando aos poucos. E essa pessoa tem me ajudado muito. Com ela, posso ser quem eu sou.”

Por Lucas Panek
28/08/2015 22h42